terça-feira, 2 de julho de 2013

Memória inaugural



                Não sei quantos pensamentos ocorrem neste momento, dentro de cada pensamento. Nem me recordo quantos deles me torturam, se é por um corpo cansado ou pela desesperança quanto ao fim do dinheiro. Carteiras e o trabalho ocupam a mesma mesa que minhas canetas, a boina xadrez, tantas vezes perdida, e o primeiro maço de cigarros.  A cara realmente é diferente, e eu sempre tenho o que escrever, só que pouco mais ou menos me lembro. Os olhos mudaram; e um painel feito na parede do quarto ainda guarda sonhos que eu quase não lembro.
                Que merda, eu nem me lembrava direito as primeiras maneiras que me fizeram escrever. As certezas que se pode ter. Quantas são? Pendurado na parede, tem um violão quase novo que há muito fora levado tantas vezes ao altíssimo. Hoje o violão não voa tão alto, mudou até de parede. Está ali, ao lado do painel de sonhos; seu antigo suporte, bem próximo ao modernismo do mural, agora sustenta um motor. O que pode significar um motor pendurado em meio a um painel de sonhos, eu também não sei. Sei tão pouco, às vezes acho tanto, mas compreendo as mudanças que se passaram nos quartos que dormi, dentro do meu peito, ou nos pensamentos.
                Outro dia terminei um conto me perguntado se era ali, naquele ponto final, que o texto ou tudo acabava. Eu ainda nem sei a resposta, ou se encontrei o tal ponto final. Espero demorar em poder encontrar todos eles, respostas e finais. Por mais que o banco seja outro, fora da lugubridade do cimento frio, por mais que seja uma cadeira dentro do quarto, dos sonhos, fechado; o barulho das motos e motores, vozes e portões, sempre voltam. Como o ponto final dos textos



Salvador Dalí - Inaugural Goose Flesh 1928