sexta-feira, 6 de junho de 2014

Se a inquietude dos meus pés formasse um desenho, qual forma ele teria


Meus passos, gestos, perdidos numa casa vazia... e se fossem filmados?
O peito se manteria cansado, ou alcançaria um céu ritmado,
alcançar a nota que o peito dá, com a calma de perceber pra qual lado
o rio corre, e onde a terra se torna má.
Pensa, martela, re-pensa sua poesia, com vida; ou sem; quase vazia
Vazia, vida poesia, rimas seguidas perdidas sem conseguir olhar o céu
ou deixar sobrar espaço para que a revoada se esconda suba, voa
Feito voz que desentoa a falar, a se perder, buscar ser. Só não bata no teclado por bater,
não risque traço de poesia se não for para nela ser, a verdade o verso que salva
da brisa, loucura, o verso que salva a vida. Não ouse escreve-lo, sem antes saber o rumo
de sua partida. Partida antiga, ida de pretérito, o partir do que se aproxima
só irá ir quando cair. Você é podre, se não perceber pense o que é que vai fazer
sobre. As manhas do seus atos, fatigam de cansaço o seu derredor.
Lembra o recanto da sua meninice, seja criança de fato mas na busca

daquela infância de antiga lembrança com o sabor doce de bondade no peito.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

pro caso de eu morrer


caso eu morra, junte meus trapos num canto
não esconda nada, deixe que as fotos
meus olhos, riscos de poesia, deixe que escorram.
mas não rasgue o que de mim sobra em matéria,
a foto 3x4 de meu rosto que já não mais existe
por favor, não rasgue. se não quiser, não guarde
enterre numa caixa e avise: esta tudo ali.
deixe meu filho poder me conhecer de fato,
deixe meu neto poder ver os documentos,
deixe que possam me conhecer, mas
caso eu morra, se eu morrer
, e a gente vai,
não me deixe... ai, se eu morrer
a morte minha, não a morte do outro
guarde o meu aniversário, mas não faça a injustiça
de rir minha cara, ou meu aniversário, lembre de meu sarro
que também já foi humano, em erro, em tudo.
pode lhe doer, eu sei, e irá, mas não rasgue a memória
não esquece os passos de sua trajetória. a criança
que nosso peito foi, e que a mente faz esquecer,
lembre de como era ser nela; infância. naquele mesmo corpo
que só era menor, mas continua o mesmo.
não rasgue sua memória, nem a minha,
respeite minhas fotos e o nosso amor que ficou nelas
deixe para a história. ai, se eu morrer...
não esquece e, por gentileza, deixe minha poesia
poder cantar em qualquer lugar, só não rasgue tudo.
rasgue uma memória ou outra, esqueça história ou outra.
mas saibas pelo que te esqueces, e o que rasgas.
saiba, ou tente, eu também estou nesse empenho,
saiba reconhecer o que fostes, o que queria ter feito
comigo. e, antes de nossa morte, antes da morte do avô,
dos genes, antes que acabem as possibilidades
dos passos quais onde nossos olhos poderiam andar em conjunto.
antes.
para não rasgar depois.


Salvador Dalí - The Broken Bridge and the Dream - 1945